Ícone nas décadas de 1980 e 1990, quando comandava atração líder de audiência no SBT, Mara Maravilha embalou uma geração que cresceu ao som de ‘Liga pra mim’, ‘Curumim’ e ‘Não faz mal’, entre outros hits. Há 14 anos, no entanto, deixou o front televisivo e a batalha pelo Ibope e se lançou como cantora evangélica. Segundo ela, uma mudança providencial.

Prestes a lançar seu quarto DVD – intitulado ‘Novo Coração’ –, Mara, que já foi musa infantil, símbolo sexual e nunca se habituou à idolatria, confessa não ter mais religião. ‘Sou de Deus’, garante. Nesta entrevista à FOLHA, a baiana já indicada ao Grammy por seus trabalhos na arena gospel, rebate as críticas que atribuem a ela, Angélica e Xuxa a formação de uma geração sexualizada, voltada ao consumo e à imagem.

Da época em que foi musa infantil aos dias de hoje, qual o saldo que acredita ter deixado? A Mara e suas contemporâneas ‘passaram’ na média?

Acredito que o lado positivo era a música, a dança, a espontaneidade. Por outro lado, deixamos a desejar. Hoje eu vejo, mas não culpo a nós, apresentadoras. Tínhamos produtores, patrocinadores. É muito fácil dizer que a Mara e a Xuxa fizeram isso ou aquilo, mas creio que, em linhas gerais, nós, apresentadoras infantis, passamos na média. Se a média fosse sete, a teríamos obtido. Mas hoje em dia é possível fazer algo melhor.

Você fez sucesso no auge dos programas infantis. E disse, certa vez, acreditar que as apresentadoras de sua época – incluindo você – tinham um forte apelo sexual. Acredita que a mensagem passada era errada? Qual era a mensagem?

Não acho que o foco era sexual, não acredito nisso. Havia, sim, uma dispersão pelo que se passava. Fazíamos, em primeiro lugar, entretenimento. E é possível fazer entretenimento com cultura, com inteligência, mas não é esse o foco da televisão. A TV não surgiu para ser didática. O foco principal não era passar uma Mara Maravilha sensual, uma Xuxa sensual. Tudo era muito espontâneo. Se formos analisar os referenciais de hoje, como o seriado Rebelde, produzido pela Televisa, as roupinhas coladas, as saias e afins continuam em evidência. Deixamos a desejar, passamos na média, mas não vamos generalizar todo o trabalho.

Mas muitos dizem que a geração de 20 e poucos anos, hoje, tornou-se sexualizada assistindo à Mara, à Angélica...

Não, muito pelo contrário. Depois das apresentadoras infantis, vieram muito mais informações. Não podemos atribuir isso à programação infantil e às roupas que vestíamos.

Nos anos 1980 você era cobrada em relação à estética como as musas atuais, que vivem no reino da lipo, do botox e demais intervenções e expedientes?

Como não sou um protótipo de beleza, de manequim e tenho um biótipo bem comum, nunca tive essa paranoia. Tenho 1.58 metro de altura, sou morena, nunca quis ficar loira para me inserir nesse ou naquele padrão. Sou a mais comum das comuns e, modestamente, acredito que eu seja a prova viva de que o talento prevalece.

Como foi deixar a exposição de todos os dias na TV e se tornar uma cantora gospel?

Providencial. O maior sucesso é você se conhecer. Se por um lado perdi muita coisa, como muitos dizem, não perdi minha índole, minhas raízes. Sou de origem humilde e me sinto bem com isso. Não perdi meu talento e nem o contato com público. Deus não dá o que a gente quer, ele dá o que a gente precisa. Muito do que eu tinha estava me sobrecarregando. Tudo que eu quis, quando eu achei que precisava, eu acabava sofrendo. Hoje eu quero o que Deus quer para mim. A vontade de Deus é boa e perfeita.

Recentemente você afirmou não ter religião e ser ‘de Deus’. Explique.

Acredito na Bíblia, em ‘amar a Deus sobre todas as coisas’ e em ‘amar ao próximo como a si mesmo’. Deus não é mulçumano, palestino, judeu ou evangélico. Deus é amor. Continuo com os mesmos conceitos. Sou anti-idolatria, acredito no Pai, no Filho e no Espírito Santo e hoje não rotulo Deus. Minha bandeira não é ‘eu sou evangélica’ e sim eu sou de Deus.

Em tempos de Mulheres-Fruta, e músicas intituladas ‘Um marido pra me bancar’, como analisa o momento das canções nacionais?

A música não foi feita para comermos poeira, e sim para recebermos a brisa do Espírito Santo. A música está cada vez mais sendo utilizada pelo próprio diabo. Ela é sonora, você não pega, não a veste, você sente a música. Algumas melodias e letras vêm com uma carga pesada. A música começou no céu. Não estou dizendo que quem grava determinada faixa que não seja para seguir a Deus esteja servindo ao Diabo, quem sou eu para julgar. Vivemos na sociedade do livre arbítrio e eu fiz minhas escolhas. Então, respeito o talento de uma Ivete Sangalo, por exemplo, e ela faz com ele o que bem quiser.

Arrepende-se de ter posado nua?

Com certeza. Acredito que quando posei nua me prostitui. Para mim, prostituta não é aquela que está na esquina, e sim aquela que está vendendo seu corpo. Eu vendi meu corpo, me arrependo. Me converti há 13 anos e só agora despertei para somente cantar músicas voltadas a Deus. As pessoas fazem escolhas o tempo todo e essa é minha escolha. No DVD ‘Novo Coração’, que lanço em maio, vou dizer tudo aquilo que gostaria.

Como é sua ligação com a filantropia? O projeto de uma ONG saiu do papel?

Todos os produtos da Turma Maravilha, que traz a Marinha, o Leleco, o Vô Galileu, entre outros, terão parte da renda revertida a um orfanato na baixada santista. Estamos em processo de registro, mas está tudo caminhando.


Fonte: Bonde